The experience of sensitivity in the works of artist Juliana dos Santos - Bubblegum Club

A experiencia da sensibilidade

Em alguns momentos somos um pouco egoístas quanto às nossas experiências e nossa sensibilidade. Reconheci isso logo que era pequena, ao começar a tocar piano. Sempre dei muito valor a minha própria experiência, ao meu próprio perfeccionismo. Eu deveria ser muito clara e exata para mim mesma. O tempo, obviamente, passa (e ainda bem). Alguns longos anos depois eu tive a oportunidade de destruir todo (ou grande parte) do meu raciocínio infantil. Já morava sozinha, dividindo casa com vários estudantes. Nela, tinha um piano na sala. Confesso que me atrevi pouquíssimas vezes a tocar. A minha sorte foi que uma das minhas colegas adorava tocar. Ela sempre gostou de tocar Ludovico Einaudi, um compositor italiano, que coincidente é uma grande paixão minha. Para mim, as músicas de Ludovico são muito potentes no sentido de fazer as coisas durarem, as experiências aumentam e sensibilidade faz com que se mergulhe e flutue. A imaginação corre, o cérebro dança.

Um dia, ao olhar o seu dedilhado veloz, disse a ela que adorava vê-la tocar. Ela então me disse que isso era o intuito dela. Além de tocar para ela mesma, queria que alguém ouvisse e compartilhasse essa experiência, que esse não fosse um momento isolado, só. Comecei a pensar sobre isso e achei diversas participações de Ludovico em várias orquestras, em concertos e não só para ele mesmo. Talvez a experiência seja para ser compartilhada. Essa é a função de museus, galerias, instalações, bienais, festivais. Compartilhar. Tirar do ateliê, do quarto, da sala de estudos. Mostrar para alguém, fazer com que alguém veja. Hoje vejo isso como uma das grandes potências da arte. O convite a imersão sensorial e experimental. Quem sabe essa seja uma das razões para grandes filas em instalações? A simples vontade de compartilhar uma experiência, de fazer parte de algo. Assim como na música, as artes visuais, também são linguagens universais. As cores, sensações, expressões deixam isso claro. Em uma conversa com a artista Juliana dos Santos, falamos sobre seu trabalho que envolve a cor azul, sensações e experiências. Da importância da cor na história, além da história das cores.

Em seus trabalhos você explora bastante a cor azul. O que essa cor representa para você?

Essa cor tem sido o exercício contrário a necessidade de representação. Ela tem me interessado como experiência sensível, como um lugar de partilha que todo mundo tem.

Uma das suas maiores obras é uma instalação que é um convite a uma imersão sensorial na cor azul. Com isso, a cor se transforma também em uma experiência. Qual é a importância da instalação e da experimentação no seu trabalho?

Entre o Azul e o que não me deixam/deixo esquecer foi minha primeira individual no Brasil e ela se trata de uma instalação interativa em que o azul é uma presença ativada pela presença das pessoas no espaço. Conforme o público vai adentrando a sala as luzes azuis vão se intensificado e ao mesmo tempo que dispara um áudio com minha voz num texto elaborado sobre minhas experiências azuis coletadas em performances em que convido pessoas para comer e beber o azul da flor da Clitoria Ternatea.

A relação com a memória é muito presente em suas obras, tanto sua própria memória pessoal, como uma memória coletiva. Isso nos leva a conectar às memórias através do azul. Para você, hoje, depois de toda essa pesquisa sobre o azul, qual seria a dimensão dessa cor em suas obras?

Eu percebo que quanto mais falo do Azul menos Azul é meu trabalho.O azul surgiu para mim como possibilidade de falar de coisas que me possibilitariam estar para além da condições da realidade imediata e violenta do que ser negra é nesse mundo. Então ele é uma desculpa para o encontro e partilhas sensíveis.

Uma das coisas que mais me chamou a atenção foi a sua conexão entre o azul e a diáspora. Qual seria o papel do azul, nas experiências afro-diaspóricas brasileiras?

Se a gente pensa no Blues para os negros dos EUA é muito interessante como eles escolheram a cor Azul pra chegar numa Blue Note, uma nota musical que demarca um sentimento que as vozes negras inventaram. Fico pensando no Banzo aqui no Brasil e qual lugar seria o nosso Azul, e quando penso nas Irmandades Negras do Rosário que a 200 anos representam os reis do Congo usando mantos azuis isso me dá pistas para pensar diferentes elaborações de significados e sentidos dessa cor na construção da memória e de narrativas nossas aqui.

O seu trabalho explora as possibilidades de experiências e presentificação. A respeito de pesquisas sobre imaginação e espaço de criação de imagens, você acredita que uma arte sensorial e imersiva proporciona avanços nesses aspectos?

Eu acho que toda arte proporciona isso, mas no meu caso eu estava em crise com a demanda de representação e representatividade. Senti a necessidade de tirar meu corpo de cena e criar espaços que o público tivesse que imaginar comigo. Eu venho da arte/educação sempre trabalhei em museus realizando visitas e ensinando arte então me interessa mais a arte na relação, na construção da presença. Para mim é importante que as pessoas se sintam parte obra.

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