Abdias Nascimento and the Black Art Museum in Inhotim - Bubblegum Club

Abdias Nascimento e o Museu de Arte Negra em Inhotim

“Para mim, a arte negra sempre foi a primeira a romper os grilhões das saturadas imagens renascentistas”

Abdias Nascimento, 1968

Há alguns fatores e conceitos que fazem cada vez mais sentido em uma sociedade pós-colonial e especialmente pós-escravidão. Lembrando que ainda estamos muito longe dessas sociedades completamente, posso dizer que estamos no início da jornada.

Um dos fatores mais importantes para que esta mudança aconteça é uma mudança de arquitetura e hierarquização do pensamento. O que lemos e aprendemos a maior parte do tempo vem de uma estrutura muito diferente daquela que estamos objetivando.

Viemos de uma estrutura eurocêntrica e heteronormativa e aprendemos do que nos é ensinado. Posso dizer que, não só pela capacidade de transformar estas hierarquias, mas também por ter uma vasta visão do futuro, conto com grandes autores como Abdias Nascimento.

Poeta, político, artista, ator, ativista, professor, jornalista, Abdias Nascimento foi um verdadeiro pesquisador da cultura afro-brasileira. Em 1950, fundou o Museu de Arte Negra, mas nunca teve sede própria, por falta de patrocínio. Este ano – junto com o IPEAFRO (Instituto de Pesquisa e Estudos Afro-Brasileiros) – o Museu Inhotim inaugura uma galeria que exibirá o acervo do Museu de Arte Negra em quatro atos, durante dois anos.

A idéia de criar o museu veio de Abdias Nascimento durante o 1º Congresso do Negro Brasileiro, realizado no Rio de Janeiro em 1950. Isto ocorreu durante uma discussão da tese ‘Escultura de origem africana no Brasil’, escrita pelo historiador e crítico de arte Mário Barata. Uma faísca começou onde Abdias, a partir da tese e do discurso do autor voltou-se para a criação do museu e para a originalidade e referência da presença do afrodescendente no mundo da arte;

Ontem eles exigiram que o artista negro esvaziasse seu conteúdo de cultura negra-africana e pintasse, nas igrejas católicas, “universal”, santos e anjos, isto é, não negros. E foi enquanto recebiam nas costas a chicotada ideológica da “civilização”; que alguns africanos criaram e legaram para nós obras importantes.

Fotografia por Senado Federal

Uma questão que se abre quando falamos sobre a criação deste museu é a temporalidade do tema. Ele foi criado e elaborado em 1950; a África do Sul do Apartheid havia sido instituída dois anos antes, em 1948 e que durou até 1994.

Museus foram fechados para artistas negros. Não havia outras referências além das Eurocêntricas que já conhecemos – e que ainda hoje estão presentes. A questão de apenas colocar em prática hoje, o que Abdias Nascimento colocou em teoria no século passado, vem de um movimento de mudança do pensamento artístico, político, histórico e cultural que conseguimos construir hoje.

O que a grande mídia brasileira e aqueles que cobriram a inauguração deste museu dizem é que o Museu de Arte Negra nunca teve uma sede por falta de patrocínio. Talvez fosse a falta de interesse dos grandes empresarios de colocar esses debates em pauta até então. Longe de que realizo um pensamento que nega a história que nos é contada, só conto e escrevo a de alguém que desconfia com grande freqüência do que nos foi dito.

Este foi um projeto futurista, um museu projetado e criado para o futuro; para um tempo em que estas questões seriam colocadas em debate – quando a colonização seria em um sentido diferente daquele até então muito bem desenhado – um tempo de descoberta, no sentido de tirar o cobertor; um tempo desacobertar o que nunca foi coberto – que neste caso do que nunca se perdeu, só foi tomado violentamente daqueles que sempre foram. Em uma época onde a escravidão, as migrações forçadas e a afro-descendência eram uma certeza – um acontecimento histórico. Numa época em que a raça é um motivo de orgulho e não apenas de aparência estética.

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