Representation in the work of Rosa Luz - Bubblegum Club

A representatividade na obra de Rosa Luz

Entre o espelho e o autorretrato há um grande abismo. Assim como a natureza morta, os retratos e autorretratos são grandes clássicos da história da arte. Retratistas eram contratados por pessoas de grande importância—e os que poderiam arcar com os custos de um—para marcarem sua presença na história de famílias e monarquias. Assim como os próprios artistas se retratavam em auto retratos, para treinos de desenhos de figura humana. Um simples auto retrato — ou mesmo por motivações pessoais. Acontece é que é esses retratos não eram tão fieis assim; e aí está o grande abismo, que os retratos não são tão fidedignos quanto os espelhos. As representações de Narciso (1599), por Caravaggio e outros artistas mostra sua adoração por sua própria imagem. Jan Van Eyck em O Casal Arnolfini (1434), deixa claro o fascínio de uma sociedade já em que o tempo para um dos primeiros espelhos alguma vez feitos. O espelho côncavo, abriga o centro da obra.

O reflexo do espelho é uma das grandes marcas da colonização no Brasil. Os portugueses, usavam de escambo suas bugigangas, como espelhos, que davam em troca de trabalhos de corte de madeira e seu carregamento até as caravelas.

Com tudo isso, quero dizer que o que se vê não é o que realmente é. Assim como a arte, que muitas vezes representa um cenário diferente da realidade, principalmente de países tidos como “subdesenvolvidos”. Para eles, a realidade de seu dia a dia sempre está com tarjas de exótico ou de diversidade. A arte que conecta o público ou que aceita a ingressão de determinado público, está longe da arte dos cânones ou dos livros de história. Eles nao mostram a arte representativa, com significante e significado para a população. Rosa Luz é artista, rapper e criadora de conteúdo. Nas suas obras, ela apresenta o que é visto, e não apenas o que é retratados. Ela visualiza o sujeito transgénero, afro-latina, usando o seu corpo como linguagem visual e descolonial. Mostrando a importância da arte para identidade e para a criação de uma. Em uma conversa comigo para a revista bubblegum club, Rosa luz fala sobre a importância da representatividade, de seu processo artístico e de seu trabalho fotográfico e musical.

Gostaria de saber como é sua relação com a fotografia. Você tem um trabalho longo sobre e pautado no auto retrato. Poderia me falar um pouco sobre isso?

Eu comecei a pesquisar fotografia na época da Faculdade, eu estudava Teoria, Crítica e História da Arte e tive uma professora chamada Ruth Sousa que me motivou a começar uma produção autoral em artes visuais. Como não tinha muita grana, decidi focar na relação entre artes visuais e tecnologia, pensando meu celular como principal instrumento para criação das minhas obras, foi quando comecei a pensar o autorretrato, de forma desprendida da técnica, para incorporar minhas limitações tecnológicas e financeiras à minha pesquisa.

Fazer autorretrato foi importante no meu processo de autoconhecimento, já que temas como identidade e psicanálise eram algumas influências que eu tive em termos de leitura, onde pude trazer algumas questões envolvendo identidade de gênero e interseccionalidade preta a partir da fotografia.

Você além de artista visual, também é rapper. Hoje você se concentra mais na sua produção musical. Consegue ver uma relação entre a música que produz e a fotografia que produziu?

Acredito que a oralidade e as artes visuais são fatores que conectam toda a minha produção, seja em fotografia, música, performance ou vídeo. Tenho estudado produção músical e sigo produzindo minhas artes de forma independente, além disso, criar conteúdo na internet é uma forma de centralizar toda a pluralidade da minha produção pensando as diversas linguagens que eu trabalho a partir da arte e tecnologia.

Pensando em seu processo criativo, como é essa mesclagem entre arte, vida, performance? Como você decide o que e como irá produzir?

Meu processo criativo é bem fluido e estou sempre aberta à co-criação, seja com outros artistas ou marcas. Acredito que todos nós estamos performando quando entramos em contato com o outro, então a performance é um elemento importante em toda a minha produção — mesmo que não pareça tão evidente em certas produções. No começo era difícil separar minha vida pessoal da minha vida pública, mas quanto mais eu estudo sobre criação de conteúdo na internet, mais fácil é lidar com a quantidade de pessoas acompanhando e tendo diversas perspectivas em relação ao meu trabalho: de pessoas que são fãs à ameaças de morte, essas são questões que preciso lidar sendo a pessoa que eu sou. Eu decido o que vou produzir a partir dos meus interesses pessoais, gosto de pesquisar e ler bastante sobre temas específicos, e isso se reflete em toda minha produção. Acredito que cada projeto pede uma linguagem artística diferente, é por isso que trabalho com várias linguagens. Além disso, enquanto criadora de conteúdo na internet, procuro

sempre dialogar com meu público para que eles possam entender os rumos da minha produção, e para que possamos ter uma troca mais efetiva e, nesse sentido, é bem comum meus próprios seguidores direcionarem alguns debates que eles acham interessante que eu faça nas minhas plataformas digitais.

Passamos sem dúvida por um mercado de arte branco, elitista, transfóbico, heteronormativo. A busca por um espaço sem dúvida é frequente e insistente. Para você, como é esta “vez dentro e vez fora” de tudo isso?

Eu tenho uma letra onde digo “não a validação, quem se valida, se submete” e acredito que essa frase marcou minha trajetória enquanto artista, porque quando parei de querer buscar uma validação externa de um mercado de arte branco, elitista, transfóbico e heteronormativo — eu comecei a dialogar com pessoas que se identificam com minhas produções artísticas e percebi que não preciso me submeter a esse cis-tema colonial que a história da arte se estruturou. O racismo e a transfobia institucional acontecem desde a criação dessa história da arte mais tradicional no Brasil, e sempre procuro dialogar com todas as camadas das artes visuais, e isso envolve criticar tudo isso também.

Acredito que o digital foi uma forma de poder ter mais espaço, pois assim consegue expandir o público que consome minhas produções artísticas, mas ainda temos muito caminho pela frente em termos de historicidade — pensando diversidade e inclusão nesse processo.

Você é um exemplo de diversidade, não só na vida pessoal, mas em seu trabalho também. Qual é a sua visão entre os espaços criados na arte para a geração de lucro através da diversidade? Para o “exótico”?

O “exótico” é um termo bastante usado por pessoas brancas racistas que compactuam com o sistema da branquitude (aquele que acredita que o branco é superior à outras raças), nesse sentido, procuro desenvolver relações comerciais apenas com pessoas que não são racistas ou transfóbicas. Prefiro não expor a minha arte, ou não vender, do que ter que me submeter à um espaço que pensa diversidade apenas como lucro.

Nos últimos anos as grandes empresas, a publicidade, os meios de comunicação e os espaços de arte estão percebendo que a diversidade é algo que vende, porque pessoas que fogem desse padrão branco também podem ser consumidores, então é um desafio perceber quem de fato está interessado na diversidade como mudança social para construir uma sociedade mais justa, e aqueles que pensam diversidade apenas nas datas

comemorativas para fingir que não são preconceituosos. O desafio é fazer um debate e troca sincera.

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